quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Texto de Apresentação BRICOLEUR

Ranhuras em transição: obra em obras.

Alexandre Lettnin traz ao público a oportunidade de observar algumas transições ocorridas em sua poética “As Ranhuras do Sensível”, construída através da coleta de fragmentos visuais da paisagem urbana que, depois de gravados em pedaços de madeira e entintados, são re-organizados no ato da impressão, repetindo, justapondo ou rebatendo as matrizes, acrescentando dessa forma, um novo conceito para cada obra.
A primeira transição pode ser observada no aspecto técnico: as madeiras, anteriormente utilizadas como matriz, passam a ocupar a função de suporte para impressões; as matrizes, utilizadas normalmente para imprimir, passam a servir como pochoir e aproveitadas assim, na pintura que, por sua vez, constitui uma re-pintura ou urdi-pintura, pois, é confeccionada em forma de urdidura com o reaproveitamento de tecidos de antigas telas. O desenho que até então constituía um instrumento subordinado à gravura passa a figurar no espaço expositivo através de materiais como o carvão e o fogo. De maneira igualmente transitiva, a temática “experienciações com a estética das cidades”, freqüente em seu trabalho, cede lugar a tentativas de estabelecer contatos com o ser humano presente no espaço urbano, com sua brevidade temporal, sua impossibilidade de transformação de um mundo fadado à repetição: momento em que o artista nos leva a refletir a respeito de questões atuais como exclusão social, acidentes aéreos e violência. Neste contexto, a figuração é utilizada a meio termo através de silhuetas escuras que aprofundam a relação tema/matéria com configurações que permitem vislumbrar a materialidade da obra em sua relação figura e fundo.
As razões de todo este proceder bem como as suas transformações, Lettnin encontrou nos escritos do antropólogo Claude Lévi-Strauss: “é sabido que o artista tem, ao mesmo tempo, algo do cientista e do bricoleur: com meios artesanais, ele elabora um objeto material que é também um objeto de conhecimento”; o artista, a exemplo do bricoleur, continua tentando arranjar-se com “meios-limites” (segundo Lévi-Strauss), visto que o seu restrito universo material não mudou: os utensílios são os mesmos, porém imbuídos de funções diferentes. Ao público fica o convite de tirar destes objetos de conhecimento, suas próprias sensações e reflexões.

André Lautenschläger

Escritor pelotense,
antropólogo,
especializado em Identidade Social pelo ICH/UFPel.

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